quarta-feira, 23 de maio de 2012

14. O cheiro a coentros frescos, misturado com azeite quente, alho e sumo de limão recorda-me a nossa viagem no meio da cozinha no Verão passado. Deixámos as almas escaldarem, quase enlouquecer de espera, fingindo durante o jantar que nada da ordem da luxúria nos tinha feito, de novo, encontrar! Mascarámo-nos por igual de simples crianças inocentes, isentas do mínimo conhecimento das causas da carne. Comemos peixe e queijos enquanto tomámos um vinho gelado na esperança de que nos pudéssemos tornar heróis, ao menos por uma noite. Nenhum de nós quis admitir a sua fraqueza. O poder que o sexo e o prazer estonteante exercem sobre a racionalidade que teimamos em salvaguardar. Quisémos mentir-nos descaradamente! Lembro-me da tua expressão meio atrapalhada dizendo, mais tarde, que não seria adequado entrares porta dentro já com as calças abertas, nem tão pouco lançares-te aos meus seios antes mesmo de me dares os cumprimentos da praxe! “Que pena!”, terei dito a sorrir... A cadeira colocada junto à parede valeu-te de amparo na cavalgada desesperada que me serviu de gozo puro! O teu fascínio de animal feroz deu-me a energia adequada para te levar para lá da tua servidão habitual. As roupas misturadas entre loiça por lavar, os suores brilhantes dos corpos a perfumar o ambiente tornando-o outro, não deixavam dúvidas de que a fome que tínhamos naquela noite, era apenas de nós os dois, juntos, fundidos, ligados até às entranhas bem fundas da nossa humanidade selvática! Uma e outra vez assumiste-te delirante! As mãos não chegavam para me conteres, a boca aberta querendo calar ao mesmo tempo que abrir palavras de estímulo, entusiasmadas perfeitas, despudoradas! Beijos uns atrás dos outros, sedentos, esfomeados, tremendos! As pernas entrelaçadas seguravam-me com a força necessária para me aguentar em perfeito descontrole. Os braços fortalecidos pelo desejo levaram-me ao colo até ao quarto, sempre sempre em perfeita fusão! Parecíamos um só, nos corpos colados até à exaustão! Cheirava a coentros frescos. Sabias a doce de laranja amarga, um dos meus preferidos. À sobremesa, voltámos à embriaguez dos corpos até adormecermos para sempre.

1 comentário:

ruiluís disse...

Olá Maria,
gostei desta prosa erótica cheia de sabores que condizem com o desejo mais profundo que temos. Um reencontro perfeito. Que belo texto.